Introdução
Os pacientes portadores de ferimentos atendidos nos serviços de urgência dos grandes centros urbanos são, na sua quase totalidade, vítimas de agressões ou de acidentes, que ocasionam feridas caracterizadas como traumáticas. É de grande interesse que esses ferimentos sejam classificados do melhor modo possível, quanto ao seu tipo, extensão e complicações. Não raro, existem conotações médico-legais, por se tratarem de casos que envolvem processos criminais, acidentes de trânsito, acidentes de trabalho etc.
Feridas traumáticas são todas aquelas infligidas, geralmente de modo súbito, por algum agente físico aos tecidos vivos. Elas poderão ser superficiais ou profundas, dependendo da intensidade da lesão. Conceitualmente, considera-se como superficial um trauma que atinja pele e tecido subcutâneo, respeitando o plano aponeurótico; considera-se profundo o traumatismo que atinja planos vasculares, viscerais, neurais, tendinosos etc.
Os ferimentos conseqüentes ao trauma são causadores de três problemas principais:
hemorragia, destruição tissular mecânica e infecção. O tratamento das feridas traumáticas tem evoluído desde o ano 3000 a.C.; já naquela época, pequenas hemorragias eram controladas por cauterização. O uso de torniquetes é descrito desde 400 a.C. Celsus, no início da era cristã, descreveu a primeira ligadura e divisão de um vaso sangüíneo. Já a sutura dos tecidos é documentada desde os terceiro e quarto séculos a.C.
Na Idade Média, com o advento da pólvora, os ferimentos se tornaram muito mais graves, com maior sangramento e destruição tissular; assim, métodos drásticos passaram a ser utilizados para estancar as hemorragias, como a utilização de óleo fervente, ferros em brasa, incenso, goma-arábica; logicamente, estes métodos em muito aumentaram as infecções nas feridas pela necrose tissular que provocam. A presença de secreção purulenta em um ferimento era indicativa de “bom prognóstico”. Os métodos “delicados’” para tratamento das feridas foram redescobertos pelo cirurgião francês Ambroise Paré, em 1585 — passouse, então, a realizar o desbridamento das feridas, a aproximação das bordas, os curativos e, principalmente, baniu-se o uso do óleo fervente.
Em 1884, Lister introduziu o tratamento anti-séptico das feridas, o que possibilitou um
extremo avanço na cirurgia; no século XX, a introdução das sulfas e da penicilina e, posteriormente, de outros antibióticos determinou uma redução importante nas infecções em feridas traumáticas, facilitando o tratamento e a recuperação dos pacientes.